A falta de um neurologista em uma UPA de Cabral na Zona Oeste do Rio fez com que a família de Eunice Pereira, de 41 anos, passasse por um calvário para constatar a morte cerebral dela, o que acabou inviabilizando a doação de órgãos da paciente. A demora no diagnóstico foi de mais de 20 horas.
Eunice morreu, no sábado, de parada cardiorrespiratória na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Campo Grande. O médico constatou a morte, mas o Rio Transplante - que coordena a doação de órgãos no estado - exige que o óbito seja confirmado por um neurologista, com o uso de um tomógrafo.
De acordo com parentes de Eunice, após a morte dela, às 18h de sábado, o médico da unidade sugeriu a doação dos órgãos. A família concordou, mas a equipe do Rio Transplante não apareceu. Às 11h de ontem, os médicos ainda aguardavam a chegada de um neurologista para constatar a morte encefálica. Um médico contou que o problema começou quando, ao ligar para o órgão, uma enfermeira exigiu que antes fosse feita uma tomografia:
Sobrinha de Eunice, Elaine Pereira contou que um parente passou a noite na UPA para assinar os papéis da doação:
- Foi muita confusão. A começar pelo médico da UPA, que chamou o pessoal do transplante sem antes fazer os procedimentos necessários.
Leiam abaixo também artigo do presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro ressaltando que os médicos também são vítimas da bagunça na saúde pública.
Os médicos também são vítimas
Luís Fernando Moraes , Jornal do Brasil
Luís Fernando Moraes , Jornal do Brasil
RIO - É consenso que todos nós, médicos ou não, estamos cada vez mais expostos à crescente violência que atinge as principais cidades do país. Não há mais o local ermo ou o horário crítico para se evitar a fim de não correr riscos desnecessários. Esta nova dinâmica também repercutiu nas unidades de saúde do Estado do Rio de Janeiro. Se a atuação dos médicos era antes respeitada pelos criminosos, hoje eles são reféns em potencial. Não faltam relatos de sequestros de ambulâncias e de profissionais para atendimento de feridos em confrontos, de invasões a hospitais para execução de rivais ou de resgates de pacientes custodiados feitos por bandidos fortemente armados.
Nos últimos anos, uma série de episódios de violência contra médicos e hospitais dominou o noticiário. As balas perdidas atingem com tanta frequência os hospitais próximos a áreas de conflito – como o Bonsucesso, o Andaraí e o Getúlio Vargas – que surgiram boatos de que algumas unidades seriam blindadas pelo Ministério da Saúde.
Há quase um ano, o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro – Cremerj - denunciou às autoridades que traficantes praticavam atos de violência dentro do Hospital Orêncio de Freitas, em Niterói. Aterrorizados, médicos, funcionários e pacientes denunciavam que traficantes circulavam livremente pela unidade e cometiam sequestros-relâmpagos e assaltos no estacionamento, nos corredores e até na cozinha do hospital, que é considerado referência na formação de cirurgiões.
Medidas extremas já foram tomadas por conta da guerra urbana. A violência forçou a desativação do Instituto Estadual de Infectologia São Sebastião, que ficava no Caju, por exemplo. Desde o seu fechamento em 2008, o Rio não conta com um hospital referência em tratamento de doenças infecciosas. Isto mostra que a maior prejudicada pela violência e pela falta de presença do Estado é a própria população.
Nos deslocamentos para os plantões, muitas vezes em horários de pouco movimento nas ruas, os médicos correm riscos. Um dos casos mais recentes é o do pediatra que foi baleado ao sofrer tentativa de sequestro-relâmpago, quando saída do plantão na UPA de Belford Roxo. Trabalhar diretamente com o público também é complicado. Ameaças de morte para forçar atendimento também são rotineiras nas emergências superlotadas.
Médicos peritos também reclamam da violência a que estão expostos nas unidades da Previdência Social. São constantes os casos de agressão por parte dos pacientes insatisfeitos, que querem manter a licença médica a qualquer custo. Cadeiras e mesas dos consultórios foram pregadas no chão para evitar que sejam usadas como armas.
Por conta desta total falta de segurança, reduz a cada ano o número de jovens médicos que aderem às chamadas para integrar equipes na linha de frente - serviços de urgência e emergência - de unidades de saúde localizadas em áreas mais críticas. Esta evasão, a médio prazo, será refletida na dificuldade de formar equipes na rede pública de saúde. E quem vai sofrer de imediato é a comunidade, já vítima do descaso das autoridades.
Esta atitude dos médicos é uma medida de autodefesa. Não se pode condenar um cidadão que abre mão da possibilidade de salvar vidas, para proteger a sua integridade física. É do Estado a obrigação de investir em ações para conter a violência, além de preservar e proteger as unidades de saúde. Os profissionais que atuam nestas unidades precisam de garantias para prosseguir com seu trabalho com tranquilidade.
Não podemos ser reféns deste sistema que expõe o médico e o isola em supostas “zonas de segurança” bem afastadas das pessoas que mais precisam de atendimento e acompanhamento na saúde pública. Somente uma mudança de paradigma, com investimento em saúde básica, em educação e em esportes, poderá modificar o status quo. É preciso acenar para a população com a possibilidade de ascensão e de inclusão social e não apenas repressão policial.
Luís Fernando Moraes é presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro – Cremerj.
Leiam abaixo a bronca da coluna Informe do Dia para o descaso do Samu no atendimento a uma mulher em Sepetiba, que morreu devido a falta de uma ambulância para socorrê-la.
2 Comente aqui:
é mais uma história que não passou no comercial de Cabral sobre as UPAs. A vergonha diária das UPAs não são mostradas.
Um absurdo essa história. Mais uma do governador que só faz fanfarrar
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